O fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Programa Nacional de Imunização, serão prioridades na gestão de Nísia Trindade, anunciada ontem como futura ministra da Saúde. Com um broche do “ Zé Gotinha” na lapela, a atual presidente da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) falou com a imprensa sobre o novo cargo, após ter seu nome confirmado pelo presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
“O nosso SUS, que mostrou tanta força e vitalidade no enfrentamento à pandemia, precisa de um olhar especial e esse vai ser o foco do meu trabalho”, disse. “[É preciso] fortalecer o Programa Nacional de Imunização, que vai se tornar um departamento [dentro do ministério], e pensar a imunização como um esforço nacional. O Brasil vai completar 50 anos desse programa, não é possível ter retrocessos”, disse.
À frente da maior instituição científica da América Latina, Trindade é reconhecida pelos pares como gestora experiente e despontou desde o início como favorita para comandar o Ministério da Saúde no terceiro governo Lula (PT). Primeira mulher a ocupar a presidência da Fiocruz, a partir de 2017, Nísia Trindade (64 anos) é servidora de carreira da instituição desde 1987. Formou-se em ciências sociais na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), onde também fez mestrado em ciência política e doutorado em sociologia, e ingressou para o quadro docente em 1991.
Reeleita para presidência da Fiocruz em 2021, teve a gestão marcada pelo enfrentamento à pandemia e foi responsável pelo protagonismo da instituição no combate à covid-19, com a produção de vacinas em parceria com a Universidade de Oxford e a elaboração de estudos que orientaram a implementação de políticas públicas no país.
Com mandato até 2024, foi reeleita depois de ser a primeira colocada na lista tríplice da instituição, obedecida pelo então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello.
Num momento de negacionismo científico e críticas infundadas à vacinação, a Fiocruz, sob o comando de Trindade, coordenou o acordo de transferência tecnológica entre a Universidade de Oxford e o Ministério da Saúde para a produção da vacina da AstraZeneca em território nacional. O imunizante, produzido nos laboratórios da instituição na zona oeste do Rio, foi o primeiro a receber o registro definitivo pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em março de 2021.
A instituição também criou o Observatório Covid-19, responsável por monitorar e divulgar pesquisas de apoio à criação de políticas públicas contra a doença, e se tornou referência pela Organização Mundial da Saúde (OMS) nas Américas. A gestão, no entanto, enfrentou questionamentos sobre o atraso na entrega de imunizantes e falta de transparência sobre os problemas.
Além do currículo e da boa aceitação entre os pares, Trindade despontou como favorita a ocupar o Ministério da Saúde diante da procura por um nome técnico e feminino para a pasta. O ex-ministro da Saúde José Gomes Temporão, também integrante do GT, diz que a escolha da cientista é um marco para a saúde brasileira. Nísia Trindade será a primeira mulher a comandar o ministério da Saúde.
“Como presidente da Fiocruz, Nísia conduziu a instituição com muita firmeza durante uma conjuntura extremamente crítica. A força e o prestígio da Fiocruz pesam muito neste momento”, diz Temporão, que também é pesquisador da fundação.
Para a presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Helena Nader, a atuação de Trindade vai além dos muros da instituição, seja pela participação na Academia Mundial de Ciências ou pela postura atuante junto à OMS na emergência sanitária.
“O papel de Nísia transcende a Fiocruz, com atuação na área da saúde indo muito além da fundação. Acho extremamente importante termos uma mulher no Ministério da Saúde pela primeira vez, mas não é por ela ser mulher que estou falando isso. A Nísia tem tudo para dar certo”, diz Nader.