Deputada sugere mudanças na legislação sobre laqueadura
Mulheres que já tinham filhos, não queriam mais engravidar e, por conta das obrigações domésticas e profissionais, não podiam ficar afastadas de seus afazeres. Portanto, ao terem a possibilidade de uma solução definitiva e simples de contracepção, com um dispositivo colocado via transvaginal nas trompas, sem necessidade de anestesia, corte ou repouso, optaram por essa possibilidade.
O que não esperavam era a dor pélvica crônica, as hemorragias, a redução na libido, a incapacidade de trabalhar, os efeitos de tudo isso sobre a vida matrimonial e doméstica, a depressão que muitas vezes acompanha essas mudanças. Em alguns casos, a perfuração e a retirada do útero.
A presidente da Associação de Mulheres Vítimas do Essure no Brasil, Kelli Luz, afirma que as brasileiras que aderiram ao dispositivo foram feitas de cobaias. “A maioria das mulheres, ou todas as mulheres que colocaram o implante Essure, foi da periferia dos seus estados. Fomos realmente feitas de cobaia, e na época não procuraram saber se esse procedimento que estava sendo feito em nós estava sendo bem sucedido em outros países. E sabemos que havia outras mulheres de outros países sofrendo com o dispositivo que foi aprovado desde 2002 nos Estados Unidos”, disse.
Kelli Luz participou de audiência nesta segunda-feira (16) da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher que discutiu o atendimento às mulheres vítimas do contraceptivo Essure no Brasil.
O Essure é um dispositivo de metal colocado nas trompas. O dispositivo, elaborado pela Bayer, foi autorizado em 2009 pela Anvisa. Em 2017, ele foi proibido depois que a detentora do registro no Brasil, a Commed, teria deixado de enviar para a Anvisa respostas para alguns questionamentos.
Indenização
No final de 2018, a Anvisa voltou a liberar o dispositivo após receber respostas da empresa, mas a própria Bayer pediu o cancelamento do registro logo em seguida. Segundo a farmacêutica, a decisão de retirar o produto do mercado foi tomada por motivos comerciais e de estratégia de negócios. Um grupo de cerca de 300 brasileiras cobra da Bayer uma indenização de 30 milhões de euros, cerca de R$ 186 milhões.
Além das sequelas físicas do uso do contraceptivo, as mulheres são muitas vezes revitimizadas no sistema de saúde, segundo a defensora pública do Distrito Federal Rita Lima.
“Muitas queixas relacionadas a um atendimento não humanizado no sistema. Se tenta ressaltar que a mulher, na sua autonomia, optou por fazer uso desse dispositivo, como se ela fosse responsável pelos riscos que, na verdade, devem ser atribuídos a todo um sistema que resultou nessa implantação como uma política pública de saúde”, observou.
A deputada Celina Leão (PP-DF), que organizou a audiência, sugeriu a criação de um grupo de trabalho na Câmara que estude mudanças na legislação.
“Eu acho que a gente poderia mexer nessa legislação nossa sobre a questão da laqueadura, e colocar esse tipo de problema já dentro da legislação”, observou a deputada.
De acordo com o diretor do Departamento de Ações Programáticas Estratégicas do Ministério da Saúde, Antônio Rodrigues Braga Neto, o dispositivo não chegou a ser incorporado pelo ministério, mas sim adquirido pelos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Tocantins, Paraíba, Piauí e pelo Distrito Federal.
“A recomendação que o ministério faz é para que os estados que adotaram por sua livre escolha, e sem nenhuma recomendação do Ministério da Saúde do Brasil o uso do Essure como um método contraceptivo definitivo, que eles organizem as suas redes estaduais e distrital. O espaço que eu, como especialista, entendo, é o espaço que trate da dor pélvica crônica. E que nesse espaço de dor pélvica crônica as pacientes possam ter uma avaliação integral, multidisciplinar, multiprofissional”, afirmou.
Busca ativa
Em nota técnica, o Ministério da Saúde recomenda que os estados que utilizaram o método realizem busca ativa de todas as mulheres submetidas ao procedimento contraceptivo e, ao serem identificadas, que sejam acolhidas e informadas quanto à retirada ou não do sistema, devendo ser acompanhadas para avaliação clínica e ginecológica, bem como avaliação especializada em caso de indicação médica para a sua remoção.
O ministério também recomenda que os serviços garantam rotinas de acompanhamento e monitoramento considerando a avaliação clínica de cada caso perante possíveis sinais e sintomas de efeitos adversos como sangramento menstrual anormal, dor pélvica crônica ou outras queixas, e orienta que as usuárias do método sejam acompanhadas por uma equipe multiprofissional, inclusive para acompanhamento psicossocial.
Fonte: Agência Câmara de Notícias