O corte anunciado de R$ 3,23 bilhões do orçamento discricionário do Ministério da Educação (MEC) ainda para 2022 é justificada pelo governo como medida necessária para reajustar os salários de todo o funcionalismo público federal em 5%.
A medida é contestada. Para os servidores, na prática, significa uma redução linear de 14,5%, que deixarão descobertas despesas da pasta e unidades vinculadas com seu funcionamento, obras, contratação de serviços terceirizados e assistência estudantil aos estudantes mais pobres.
Segundo o economista Marcio Pochmann, ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a nova investida do governo federal nas verbas destinadas às federais faz os recursos universitários públicos recuarem para “cerca da metade do que era em 2015”.
Já Nilton Brandão, presidente da Federação de Sindicatos de Professores e Professoras de Instituições Federais de Ensino Superior e de Ensino Básico Técnico e Tecnológico (Proifes-Educação), vê uma situação ainda mais dramática. Segundo ele, as estimativas das entidades que representam o setor educacional federal apontam um orçamento equivalente há 10 anos.
A morte do ensino
Brandão compara que, nesse período, houve um grande crescimento de matrículas, de campus, de servidores e que a “regressão violenta de orçamento” pode ser, de fato, a morte das universidades e instituições federais de educação.
“O que se tem visto nos últimos anos é que no segundo semestre as instituições vivem com o pires na mão, cortando despesas básicas e necessárias para conseguir virar o ano. Grande parcela vira com dívidas. Não tem mais o que se fazer diante de um corte tão drástico”, assevera diante do que considera uma precarização total do ensino promovido pelo atual governo federal.
Inviabilizando a permanência
Para a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) não será somente o funcionamento das instituições federais de ensino que será afetado. O corte direto para o setor, que ultrapassará R$ 1 bilhão, irá inviabilizar a permanência daqueles estudantes que são considerados socioeconomicamente vulneráveis.
Corte afetará a metade mais pobre dos estudantes
Ricardo Marcelo Fonseca, reitor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) lembra que um relatório feito em 2018 pela Andifes demonstrou que 53,5% dos estudantes das federais tinha uma renda per capita familiar abaixo de um salário-mínimo.
Para ele, o mesmo levantamento apontou que 69,9% dos estudantes das federais tem renda per capita familiar até um salário-mínimo e meio. “Aposto que esse cenário piorou desde 2018”, fala.
As instituições de ensino superior e os institutos federais vêm sofrendo sucessivos cortes e bloqueios. Para esse ano, os recursos foram menores do que o montante reservado no primeiro ano do governo Bolsonaro. Foram de R$ 6 bilhões em 2019 para investimentos, manutenção e bolsas estudantis.
Andifes denuncia agravo da situação
De acordo com a Andifes, para que os institutos de ensino superior federais mantivessem seu poder de compra a dotação orçamentaria deveria ser de pelo menos R$ 7,2 bilhões. Apenas R$ 5 bilhões foram destinados. A decisão de Bolsonaro agrava a situação.
O corte prometido por Bolsonaro ainda atinge outras instituições vinculadas ao MEC. Entre elas o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh).
Chantagem financeira como estratégia de governo
O presidente da Proifes-Educação diz que “a desconsideração com a educação pública é uma política do governo Bolsonaro não só do ponto de vista ideológico”.
Para Brandão, o atual governo usa um instrumento prático de estrangulamento financeiro “na perspectiva de desqualificar as universidades e institutos federais, desqualificar os professores e professoras, desqualificar os cursos e a ciência e tecnologia do país”, afirma.
“Não vamos aceitar a culpa pelo corte na educação”
Em sintonia com a nota da Andifes, Brandão afirma que defasagem salarial do funcionalismo federal é bem maior do que os 5% prometido por Bolsonaro. Chega a 19,99%.
No caso do magistério federal, afirma o dirigente, a defasagem está na casa dos 38% levando em consideração as perdas salariais desde 2017.
“Não vamos aceitar a culpa pelo corte na educação. Vamos denunciar Bolsonaro como um mentiroso que tenta mais uma vez penalizar, criminalizar os servidores públicos pela sua incompetência na gestão do país em seu conjunto. É uma mentira, é uma falácia”, indigna-se Brandão. Ele ainda registra que há apenas notícias jogadas na imprensa e que as entidades de servidores se mobilizam para reverter as medidas anunciadas no Congresso Nacional.