A esquerda encontrou na cultura uma trincheira em que consegue triunfar e liderar em interações depois de perder há anos engajamento nas redes sociais. Conforme levantamento do Observatório Democracia em Xeque, da PUC-Rio, feito a pedido do Estadão, é no Instagram, pela dificuldade de replicar conteúdo, onde a distância entre as duas correntes ideológicas diminuiu.
De acordo com o estudo, a direita respondeu este ano, em média, por 53,7% das interações no Instagram, contra 43,5% da esquerda e 2,8% do centro. A direita liderou as interações em 108 dias, enquanto a esquerda teve o melhor desempenho em 36.
Durante o festival, artistas se manifestaram contra o presidente Jair Bolsonaro (PL) e realizaram atos a favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Num dos principais deles, a cantora Pabllo Vittar exibiu uma toalha que estampava o rosto do petista para o público e as câmeras que transmitiam o evento ao vivo.
À época, o PL, partido do presidente, moveu ação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para impedir a manifestação de artistas, pedido acolhido em decisão liminar pelo ministro Raul Araújo. No dia 28 de março, a sigla recuou, a pedido de Bolsonaro, irritado com a repercussão do caso.
“Há uma hegemonia da direita evidente em todas as plataformas desde o impeachment contra a ex-presidente Dilma Rousseff”, disse Alves. “Mas, quando há esses picos, há um movimento da esquerda de furar a bolha. É no campo cultural, por parte desses influenciadores, de grandes eventos, que a esquerda tem a sua maior oportunidade para conseguir dialogar com mais públicos.”
Maria Carolina Lopes, pesquisadora em Democracia e Comunicação Digital, afirmou que o Lollapalooza trouxe um característica que funciona em uma campanha eleitoral: mostrou uma militância se manifestando de uma forma que parece espontânea. “A questão da toalha é bem importante: agregou um ícone pop, assim como os apoiadores do Bolsonaro andavam com uma blusa do Ramones com o nome dele e dos filhos.”
A “guerra cultural” é um jargão difundido pelo ideólogo Olavo de Carvalho e usado por bolsonaristas para falar da disputa com a esquerda. O embate, apontou a socióloga Esther Solano, da Unifesp, é travado sobretudo nas redes. “Lá, é possível usar da polêmica e da controvérsia como recursos para alcançar outros públicos.”
Artistas que se posicionaram a favor do presidente recentemente protestaram contra a Lei Rouanet, como o cantor Gusttavo Lima e da dupla Zé Neto e Cristiano. A lei é alvo constante do presidente e de seus aliados.
“Imagino que haverá muita pressão à medida que a eleição chegue, que é a pressão para artistas se posicionarem”, afirmou Alves.
Estadão