Capacitação realizada pela Embrapa Pecuária Sul para profissionais de assistência técnica e extensão rural do sistema Farsul/Senar teve como tema o Processo de Abordagem Sistêmica na agropecuária do Rio Grande do Sul. Com a participação de cerca de 80 profissionais da Assistência Técnica e Gerencial (ATeG) e Programa de Formação Profissional do Senar-RS, a capacitação foi realizada em quatro módulos, divididos em dois dias (16 e 23/08) e abordou diferentes aspectos relacionados aos sistemas de produção, com destaque para a pecuária. A iniciativa faz parte do Projeto Duas Safras, uma parceria entre a Embrapa, Farsul e Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) que busca o desenvolvimento da agropecuária gaúcha. Além da Pecuária Sul, outras unidades da Embrapa participam do projeto: Clima Temperado (Pelotas), Trigo (Passo Fundo) e Suínos e Aves (Concórdia).
Esse foi o primeiro curso realizado pela Embrapa Pecuária Sul dentro do projeto, que tem entre seus objetivos um trabalho de capacitação continuada de técnicos que atuam junto aos produtores rurais do estado. Para Fernando Cardoso, Chefe-geral da Embrapa Pecuária Sul, o projeto Duas Safras é um importante passo para organizar os sistemas de produção agropecuários, garantindo sustentabilidade para o setor, maior competitividade e rentabilidade para a atividade. Já o superintendente do Senar-RS, Eduardo Condorelli, destacou que a parceria com a unidade da Embrapa é uma oportunidade para que os técnicos possam contribuir de forma mais eficaz no desenvolvimento da pecuária gaúcha. “A partir dessa visão sistêmica é possível vislumbrar de forma mais clara o papel da pecuária para o setor primário e para toda a economia do estado”, ressaltou.
Um dos tópicos abordados foi o planejamento dos sistemas de produção. Segundo o pesquisador da Embrapa, Danilo Sant`Anna, em relação à produção pecuária um dos primeiros pontos a se analisar e corrigir é o ajuste de carga animal em uma área. De acordo com ele, o produtor tem que ter um número de animais de acordo com a oferta de forrageiras para sua alimentação. “Isso pode ser feito de duas maneiras, aumentando a oferta de pasto ou diminuindo a quantidade de quilos de animais na área”. Para isso, segundo Sant`Anna, é preciso conhecer a capacidade de suporte de uma determinada área, para que os animais tenham uma oferta suficiente de alimentos para o seu desenvolvimento e produção. Para o pesquisador, é preciso avaliar essa e outras questões dentro de uma perspectiva do funcionamento do sistema de produção como um todo, em que todos os elementos são importantes para um bom resultado. Esse resultado não é simplesmente a soma das partes de um sistema do produção, mas sim consequência da integração funcional entre as mesmas, onde qualquer tomada de decisão sobre uma parte causa reflexos, positivos ou negativos, nas demais. Por isso a ênfase no planejamento e monitoramento do sistema de produção como um todo, integrando suas atividades nas diferentes áreas, ao longo das estações climáticas e ao longo dos anos.
Dentro do planejamento forrageiro, o pesquisador Danilo Sant`Anna falou também sobre o conceito Pasto sobre Pasto, que é uma estratégia de manejo para uso de mesclas forrageiras visando melhor distribuição de forragem. O conceito une uma série de práticas de manejo que possibilitam o uso de mais de uma espécie forrageira na mesma área e ao mesmo tempo. De acordo com Sant`Anna, essa estratégia tem como objetivo, além de ofertar alimentação balanceada para os rebanhos, manter maior estabilidade da produção de pasto ao longo do ano, minimizando inclusive os períodos de vazios forrageiros.
Já em relação às forrageiras, o pesquisador Daniel Montardo ressaltou que já está disponível no mercado um leque de cultivares de diferentes espécies forrageiras tanto de inverno como de verão. “Somente a Embrapa lançou 23 cultivares nos últimos anos, de gramíneas e leguminosas, que permitem ao produtor fazer um planejamento forrageiro adequado, garantindo assim a oferta de alimentos durante o ano todo”. De acordo com Montardo, já se encontram disponíveis cultivares de azevém, aveia, centeio, trigo, cornichão, trevos, capim-sudão, milheto e sorgo, entre outras, oferecendo um variado cardápio para o produtor oferecer aos animais em diferentes ambientes e integrados à diferentes sistemas de produção. Também em relação às forrageiras, o pesquisador Gustavo Martins da Silva falou sobre a importância na qualidade das sementes. Segundo ele, sementes com procedência, boas taxas de germinação e vigor, e de cultivares registradas no Ministério da Agricultura são essenciais para o bom estabelecimento de uma pastagem. “Apesar da legislação existente, o mercado informal de sementes ainda é grande e pode trazer prejuízos ao produtor, seja na deficiência da pastagem plantada ou mesmo na introdução e propagação involuntária de espécies não desejadas”.
O avanço das culturas agrícolas na metade Sul do estado, principalmente da soja, onde é praticada cerca de 90% da pecuária de corte do RS, foi outro ponto abordado na capacitação. Para Danilo Sant`Anna, a integração lavoura-pecuária é uma alternativa bastante viável para o sucesso tanto da agricultura como para a criação de animais. “Desde que seja bem planejada e com um manejo adequado, uma atividade pode contribuir, e muito, com a outra, formando um sistema de produção com ganhos nas atividades, além da sustentabilidade da agropecuária”.
Segundo Danilo, a integração quando feita de forma correta pode ser realizada com diferentes culturas agrícolas, como a soja, o arroz, que é tradicionalmente cultivado na região sul do estado, ou com outras espécies. Uma das preocupações dos produtores de soja atualmente na região são plantas indesejadas que apresentam resistência a herbicidas, como o caruru. A pesquisadora Fabiane Lamego relatou que a Embrapa já está realizando estudos visando diminuir a presença dessas plantas nas lavouras, e que a rotação com pastagens pode ser uma opção barata e sustentável de lidar com o problema.
Para a professora e especialista em solos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Amanda Posset Martins, a pecuária, principalmente com um bom manejo das pastagens, pode contribuir muito para a qualidade e fertilidade dos solos. “As forrageiras, sejam nativas ou cultivadas, com adubação e pastejadas com a carga animal certa contribuem para o acúmulo de matéria orgânica nos solos, bem como de outros nutrientes essenciais para a fertilidade e saúde do solo”. Segundo ela, essa característica, já demonstrada em diferentes estudos, contribui também para o bom desempenho das culturas agrícolas, diminuindo a necessidade de aporte de adubação química e garantindo boa produtividade.
Para o pesquisador Gustavo Martins da Silva, um dos objetivos da capacitação foi o de apresentar diferentes temas dentro de uma abordagem sistêmica. “Esse tipo de abordagem busca compreender os elementos internos de um sistema de produção e suas interrelações, além do ambiente externo”. Nesse sentido, segundo o pesquisador, a parceria prevê um trabalho conjunto entre a pesquisa, a extensão rural e os produtores no encontro de soluções para os diferentes sistemas de produção.
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Fernando Goss
Jornalista – Núcleo de Comunicação Organizacional